Ciclismo x Saúde Sexual e Reprodutiva do Homem

A prática de esportes como o ciclismo pode influenciar na saúde sexual e na fertilidade masculina, principalmente no caso dos ciclistas “pesados” (aqueles que praticam mais de 3 horas de pedal por semana). Dentre os eventos mais frequentes, cabe destacar o encarceramento do nervo pudendo, secundário à inflamação crônica decorrente do impacto do períneo contra o selim (banco da bicicleta). Essa situação pode levar à perda de sensibilidade da região escrotal, além de problemas relacionados ao suprimento sanguíneo do pênis e potencial prejuízo à qualidade das ereções. Particularmente, com relação à fertilidade masculina, existem estudos sérios na literatura médica internacional demonstrando piora da qualidade seminal (principalmente, relacionados ao formato inadequado dos espermatozoides ejaculados) em ciclistas pesados. shutterstock_150348161A principal explicação para esse problema recai sobre a dificuldade da manutenção da temperatura adequada dos testículos entre esses esportistas. Sabemos que a boa produção de espermatozoides exige um “ajuste fino” da temperatura dos testículos, que deve estar ao redor de 2ºC abaixo da temperatura corporal. Durante o ciclismo, há elevação da temperatura desses órgãos (devido a fatores como fricção desses contra as coxas e o selim, uso de trajes esportivos que trazem os testículos para junto do corpo, exposição a altas temperaturas durante longos intervalos), tornando o microambiente testicular subótimo para a espermatogênese (produção de espermatozoides). Já a relação do ciclismo com torções testiculares é menos evidente. Existem alguns relatos esporádicos na literatura médica que assinalam tal relação, mas de forma absolutamente não consistente. Sabemos que a torção testicular ocorre, muitas vezes, devido a problemas de fixação do testículo dentro da bolsa testicular. Exercícios físicos podem deflagrar a ocorrência da torção nesses pacientes já predispostos por meio do chamado reflexo cremastérico, mas não as causar diretamente.

FATORES EXTERNOS: O SELIM DA BICICLETA E O TERRENO PERCORRIDO PELO CICLISTA

É certo que o selim tradicional gera impacto direto nos testículos e no períneo (região abaixo da bolsa testicular, de contato íntimo com a próstata). Um treino com bicicleta em baixa velocidade (com menos impacto aos testículos) e em terreno plano (gerando menos impacto ao períneo e à próstata) será menos prejudicial do que um treino rápido e em terreno acidentado. Um treino realizado em bicicletas ergométricas horizontais (em que não há selim, mas um banco) trará muito menos carga aos órgãos genitais. Evidentemente, o próprio atleta saberá reconhecer o limite entre o benefício e a sobrecarga, ajustando o tipo de selim, de treino e de terreno às suas necessidades e limites.

O CICLISMO E O EXAME DE PRÓSTATA

Ao contrário do que algumas pessoas imaginam, não há nenhum problema em se examinar a próstata de um indivíduo no dia seguinte ao um treino com bicicleta, por meio do toque prostático (exame em que o médico avalia a próstata do paciente através do reto). É certo que há alguma controvérsia com relação a se realizar exames de sangue (PSA – antígeno prostático específico) após a atividade. Porém estudos mais recentes demonstram que não há problemas em realizá-lo no dia seguinte a um treino com bicicleta, chegando mesmo a ser possível realizá-lo no mesmo dia do treino. Alguns pesquisadores apontam que pode ocorrer uma discreta elevação nos níveis de PSA no caso desse ser realizado com menos de 48 horas após o treino; mas essa elevação seria extremamente discreta, não causando problemas à interpretação do exame. Não há evidências de que uma dosagem de PSA examinada posteriormente a uma sessão de ciclismo (ou até mesmo no mesmo dia) não pode ser considerada correta. Evidentemente, se o indivíduo for sabidamente portador de níveis elevados de PSA, ou for portador de problemas prostáticos que exijam monitoração muito rigorosa dos níveis de PSA (pacientes em tratamento de câncer de próstata, por exemplo), um intervalo de dois dias entre a última sessão de pedal e o exame de sangue trará mais segurança a todos.

TORÇÃO TESTICULAR E NEOPLASTIA DO TESTÍCULO: A IMPORTÂNCIA DA IMEDIATICIDADE NA PROCURA MÉDICA

Existem duas entidades que devem ser reconhecidas imediatamente. Vale ressaltar que nenhuma delas é causada diretamente pela prática esportiva, mas o exercício pode torná-las mais notáveis, e acaba sendo comum relacioná-las ao esporte. A primeira é a torção testicular, que ocorre, primordialmente, em adolescentes e adultos jovens. Os principais sinais de alerta são a dor de instalação abrupta, principalmente pela manhã, associada ou não a aumento do volume do testículo. Essa situação exige a avaliação imediata de um urologista. O tempo é importantíssimo e pode significar a diferença entre um tratamento simples e a perda do testículo. A segunda (mas não menos importante) é a neoplasia do testículo. É muito frequente que se percebam os sinais de um tumor de testículo durante o exercício, sem que haja relação de causa e efeito. O principal sinal de alerta é a presença de aumento de volume testicular decorrente da presença de uma massa ou nódulo no interior da bolsa testicular. O exame físico realizado por um médico especialista é imperativo, e o diagnóstico é realizado de imediato; também, nesse caso, os adolescentes e adultos jovens são os mais acometidos. O tempo é novamente fundamental, visto que 95% dos tumores de testículos são curáveis desde que descobertos precocemente. Além dos problemas já citados, existe o Trauma testicular, decorrente do impacto direto, que, igualmente, merece avaliação imediata, pois pode demandar tratamento cirúrgico. Essa entidade, raramente, passa despercebida entre os homens devido, principalmente, ao quadro doloroso associado.

 OS ESPORTES E A SAÚDE SEXUAL MASCULINA

Todos os esportes que envolvem impacto direto (artes marciais, esportes de quadra, montaria) podem provocar trauma aos órgãos genitais e consequente impacto na vida íntima masculina. Por isso, devem sempre ser praticados tomando-se os cuidados específicos (prática em local adequado, uso de equipamentos de segurança, atenção à prática correta). Os maiores riscos não estão relacionados à prática esportiva em si, mas sim à maneira como ela é realizada. Atletas amadores, que praticam o esporte de maneira usual, sob supervisão, só terão benefícios. Riscos à saúde masculina são mais evidentes em atletas de alta performance, que praticam o esporte em níveis suprafisiológicos. Uso de esteroides anabolizantes, por exemplo, é um capítulo à parte na infertilidade e saúde sexual do homem, e, muitas vezes, é esse uso a causa de alguns dos problemas relativos a essa questão. Comumente, os esteroides anabolizantes são utilizados sem qualquer tipo de acompanhamento médico, de maneira absolutamente inadequada, com resultados, não raro, devastadores à vida reprodutiva do indivíduo.

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Apesar da ampla discussão sobre o impacto do ciclismo na fertilidade e saúde sexual masculina, vale a menção de que grande parte da literatura disponível sobre esse tema é praticamente unânime em associar tais problemas apenas aos ditos ciclistas “pesados” (com mais de 3 horas semanais de treino). Os atletas leves e moderados, que não praticam o ciclismo de alta performance, apresentam menos horas de treino, menos sobrecarga e, consequentemente, menos risco. Evidentemente, o benefício trazido pela prática esportiva do ciclismo nos atletas “usuais” suplanta qualquer interferência negativa na saúde íntima masculina. Revisarmos tais interferências significa apenas que existem problemas de saúde que podem estar relacionados ao esporte, e que o especialista que lidará com essas entidades deverá estar atento a tais possibilidades. O ciclismo, no entanto, constitui uma excelente opção esportiva de baixo impacto, com grande efeito cardiovascular e capaz de reduzir riscos de hipertensão, diabetes e derrames, o que certamente se sobrepõe aos seus potenciais riscos.

 

 

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