TESTOSTERONA BAIXA: COMO TRATAR?

Quando pensamos no bom funcionamento de nosso organismo, fica mais fácil entendermos tudo se fizermos algumas analogias. Trabalhamos durante uma vida toda, com o mesmo corpo. Obviamente, transformações acontecem nesse longo tempo. Algumas são naturalmente bem-aceitas, como a puberdade e a adolescência. Chega-se ao final dessas etapas no início da fase adulta, quando tudo funciona perfeitamente, sempre com tendência a melhorar. Mas e as mudanças que acontecem um pouco mais tarde? A fase dos 40 e 50 anos é igualmente rica em transformações.
 
No entanto, sob o ponto de vista evolutivo, “moramos” em um sistema orgânico que até poucos anos, deveria nos acompanhar durante um período muito mais curto, uma vez que há alguns poucos séculos, vivíamos bem menos do que vivemos hoje. A expectativa de vida de um homem, na Idade Média, era de cerca de 40 anos. Hoje, no Brasil, de acordo com o IBGE, espera-se que um homem viva, em média, 75 anos. Em pouco tempo, esta expectativa de vida será ainda maior, dado os grandes avanços na ciência médica e na qualidade de vida e alimentação. Isso significa que estamos ainda aprendendo a conviver com este tempo adicional que vamos ganhando, pouco a pouco.
Evolutivamente, não precisávamos conviver muito tempo com o desgaste biológico que naturalmente nos acomete a partir da 5ª década de vida. Mas agora precisamos, além de conviver com esse “desgaste”, ter a maior chance possível de obter performance ótima, dado que homens com 40, 50 e 60 anos são tão ou mais produtivos que homens mais jovens. O perfil contemporâneo não prevê um homem de 50 e 60 anos desgastado, mas sim em seu ápice profissional e pessoal na grande maioria das vezes.

Esse cenário é particularmente verdadeiro quando consideramos determinados tipos de influência que o “desgaste” natural de nosso organismo impõe ao homem de hoje. O mais conhecido deles é o Declínio Androgênico do Envelhecimento Masculino (DAEM), também, conhecido como Hipogonadismo de Início Tardio (HIT), ou mais popularmente como “andropausa”.

As mulheres já convivem com essa situação há mais tempo. Não é de hoje que a menopausa, que acomete a mulher ao redor dos 45 anos, vem sendo alvo de cuidados. As mulheres já incorporaram a necessidade de realizar a adequação dos níveis hormonais nessa etapa da vida, de modo a obter benefícios de uma vida saudável, de maneira segura e controlada.

A ANDROPAUSA CHEGOU, E AGORA?

Os homens, cada vez mais, vêm mostrando preocupação com os anormais níveis baixos de testosterona. A testosterona é o principal hormônio masculino, e redução de seus níveis pode estar associada a alguns sintomas típicos da idade madura. Trata-se de um hormônio intimamente relacionado com bem-estar geral e sexual, performance cognitiva e saúde óssea e muscular.

SINTOMAS DE ” TESTOSTERONA BAIXA”

Quando existe uma redução dos níveis de testosterona além de certo ponto, é frequente encontrarmos sintomas como:

  • Redução da libido (vontade de fazer sexo).
  • Diminuição da qualidade ou frequência das ereções.
  • Redução da massa muscular e aumento da quantidade de gordura corporal.
  • Osteopenia ou osteoporose.
  • Sensação de fraqueza.
  • Mal-estar.
  • Piora da concentração e da qualidade do raciocínio.
  • Irritação e até mesmo depressão.

Dessa forma, se existem sintomas de “andropausa” associados a níveis comprovadamente baixos de testosterona sanguínea, estamos diante de um potencial candidato a receber terapia de reposição de testosterona (TRT). O objetivo é restaurar os anormais níveis baixos de testosterona, elevando-os a níveis mais próximos daqueles apresentados por indivíduos mais jovens, com o objetivo de se obter melhor qualidade de vida.

Naturalmente, como qualquer outro tratamento médico, a TRT não pode ser prescrita para todas as pessoas, nem de forma sempre igual. Só existe sentido em oferecer TRH para um homem que realmente apresente níveis baixos do hormônio, com sintomas claramente identificáveis, que estejam levando o paciente à redução de sua qualidade de vida. Entre os sintomas e problemas clássicos, temos alguns “gerais” e outros de ordem “sexual”:

Texto

Fonte Aversa A, Morgentaler A. The practical management of testosterone deficiency in men. Nat Rev Urol. 2015 Nov;12(11)641-50.

 Fonte da imagem: Aversa AMorgentaler A. The practical management of testosterone deficiency in men. Nat Rev Urol. 2015 Nov;12(11):641-50.

Sabemos que homens portadores de DAEM têm mais chance de apresentar diversos problemas ao longo de sua vida. Entre os mais importantes, vale destacar o diabetes, a osteoporose (com risco de fraturas) e as doenças cardíacas.

Portanto, indivíduos com sintomas e com níveis comprovadamente baixos de testosterona total (<350ng/dL) e/ou de testosterona livre beneficiam-se imensamente da terapia de reposição de testosterona. Dosagem correta em laboratório de confiança é um passo primordial para definirmos o diagnóstico, sendo que a coleta de sangue deve ser realizada, preferencialmente, pela manhã. Podem ainda existir homens com níveis satisfatórios, pouco acima desse limite, mas apresentando sintomas, sendo encarados como portadores de DAEM. Isso ocorre porque alguns indivíduos apresentam menor sensibilidade para o hormônio, precisando de níveis mais altos para atingir seu melhor status hormonal. No futuro, possivelmente, não consideraremos apenas os níveis laboratoriais de testosterona, e sim a sensibilidade individual, para definir os níveis adequados de maneira personalizada.

Existem linhas de pesquisa em relação à avaliação do CAGn (ou “polimorfismo da repetição citosina-adenosina-guanina”), para que um dia cheguemos a esse refinamento. Essa individualidade explica o fato de alguns indivíduos sentirem-se bem com níveis mais baixos, e outros apresentarem sintomas mesmo com dosagens um pouco mais elevadas. Daí a relevância dos sintomas que cada um apresenta.

COMO SURGEM OS BENEFÍCIOS DURANTE A REPOSIÇÃO HORMONAL?

Sabemos que as pessoas com DAEM que realizam TRT podem se beneficiar de diversas maneiras, algumas delas com mais rapidez que outras. Seguem algumas, na ordem em que geralmente ocorrem:

  • Sensação de bem-estar: costuma ser a referência que vemos primeiro durante a TRT. Ao redor da 3ª-4ª semana, já costuma existir menção quanto à melhora na qualidade de vida de modo geral, principalmente, pela percepção subjetiva do paciente.
  • Libido: o benefício em geral ocorre logo nas primeiras semanas de tratamento, com percepção por parte da maioria dos pacientes após 3-6 semanas. Potência (ereção) e controle da ejaculação tendem a melhorar, também, mas com um pouco mais de demora.
  • Melhora dos quadros depressivos: sintomas de depressão tendem a reduzir perto da da 6ª semana, com benefício progressivo, chegando, ao máximo, ao redor de 5 a 7 meses. Redução da necessidade de antidepressivos é notável quando níveis realmente baixos de testosterona coexistem com a depressão.
  • Redução da gordura e aumento da massa magra: são benefícios que levam muitos homens a procurar esta modalidade terapêutica. Ocorrem a partir de 3-6 semanas, progredindo até 6-12 meses quando há estabilização.
  • Saúde cardiovascular e redução dos níveis de colesterol: demora um pouco mais para identificarmos, mas, ao redor de 6 meses após o início da TRT, novas dosagens de colesterol são sugeridas, inclusive para se reavaliar a necessidade de manutenção de medicações como estatinas. Comprovadamente, o emprego correto da TRT se correlaciona com redução de risco cardiovascular, redução de infarto agudo do miocárdio e acidente vascular cerebral (AVC), incluindo possível benefício na sobrevida. O controle do diabetes é melhorado (ou reduz-se a chance de surgimento desse problema), o que, também, incrementa a qualidade de vida e colabora com redução de mortalidade. Há restrições para uso de TRT em indivíduos com determinados problemas cardíacos graves e pessoas vítimas de infarto agudo do miocárdio há menos de 6 meses.
  • Disfunção erétil e ejaculação precoce: existe melhora desses sintomas, após 6 a 12 meses de TRT. São benefícios que custam mais a surgir, mas são de extrema importância para o homem, pois as estratégias clássicas de tratamento para essas condições envolvem uso diário de medicação, muitas vezes, sob demanda. Atualmente, na andrologia contemporânea, não há mais espaço para tratamento dessas condições sem uma avaliação hormonal ampliada, com dosagem de esteroides sexuais masculinos e femininos, gonadotrofinas, hormônios tireoidianos e painel bioquímico. Se houver um desajuste, é preciso corrigir antes de definirmos a real condição do indivíduo.
  • Saúde óssea e osteoporose: a melhora da qualidade óssea e redução da osteoporose e do risco de fraturas são benefícios que mais tardam a vir, mas são, definitivamente, dos mais importantes, principalmente, após 60-70 anos. Avaliação da densidade mineral dos ossos pode ser facilmente mensurada por meio da densitometria óssea, que também servirá para determinarmos o benefício e a necessidade ou não de incrementar o tempo de tratamento.

AFINAL, TRT CAUSA CÂNCER DE PRÓSTATA?

Infelizmente, ainda, é difundido o conceito de que TRT pode causar câncer de próstata (CaP). Já está completamente esclarecido que isso não é verdade. Sabemos que o uso incorreto de testosteronas sintéticas (anabolizantes), elevando exageradamente os níveis de testosterona com finalidade estética ou atlética, pode aumentar a chance de diversos problemas. No entanto, corrigir níveis baixos de testosterona não causará câncer prostático.

A idade em que a testosterona sérica está mais alta no homem é durante sua adolescência e juventude (até os 30 anos), que é justamente a faixa etária em que virtualmente não há câncer de próstata. O surgimento tumoral é um fenômeno complexo, que ocorre, com maior frequência, em homens acima de 50 anos, com níveis particularmente baixos de testosterona. Não se indica TRT em homens portadores de CaP em atividade, mas existem diversos grupos no mundo que preconizam TRT para pacientes que tiveram CaP já tratados, quando estes apresentam DAEM e sintomas severos. Evidentemente, homens recebendo TRT precisarão de supervisão médica, e o controle urológico deverá ser periódico por meio de exames clínicos e laboratoriais, como o PSA (antígeno prostático específico), que mede atividade biológica da próstata.

 

COMO É REALIZADA A TRT?

Existem diversas formas para levarmos a testosterona ao organismo. As modalidades são disponíveis de forma variada nos diversos países, com maior ou menor facilidade de acesso. Cada uma delas apresentando vantagens e desvantagens.

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                Fonte: Aversa AMorgentaler A. The practical management of testosterone deficiency in men. Nat Rev Urol. 2015 Nov;12(11):641-50.

 

No Brasil, temos disponíveis as formas injetáveis e transdérmicas (testosterona gel e testosterona creme). Não existe uma forma que seja claramente superior à outra: existe equilíbrio entre características que podem tornar uma modalidade mais ou menos interessante para cada pessoa. Uma vez estabelecida a necessidade desse tipo de tratamento, a escolha da forma de administração ficará a cargo do médico e do paciente que, juntos, definirão a maneira mais efetiva, confortável e segura para cada situação.

Fontes

Aversa A, Morgentaler A. The practical management of testosterone deficiency in men. Nat Rev Urol. 2015 Nov;12(11):641-50.

Lunenfeld B, et al. Recommendations on the diagnosis, treatment and monitoring of hypogonadism in men. Aging Male, 2015; 18(1): 5–15

 

 

Dr. Guilherme Leme de Souza