MITOS E VERDADES

  • Homens portadores de azoospermia não podem ter filhos biológicos

Mito. Essa afirmação foi verdadeira até 1992, quando se obteve a primeira gestação através de FIV, com uso de espermatozoide capturado cirurgicamente do interior dos testículos. Atualmente, os homens que possuem azoospermia não obstrutiva podem ser submetidos à exploração do interior dos testículos (pela cirurgia conhecida como microTESE), com sucesso na obtenção de espermatozoides em cerca de 60% dos casos. Isso torna possível aos homens portadores de azoospermia o projeto de ter filhos biológicos.

  • Vasectomias com mais de 10 anos não podem ser revertidas.

Mito. Há relatos de homens que reverteram vasectomias realizadas há mais de 25 anos e foram capazes de engravidar naturalmente a parceira. Sabemos que vasectomias com mais de 15 anos apresentam maior quantidade de tecido cicatricial no ducto deferente, tornando a reversão mais desafiadora. As taxas de sucesso apresentam queda, também, mas o procedimento não deve ser retirado do arsenal terapêutico apenas pelo tempo de realização da vasectomia. A decisão deve ser tomada levando em conta o perfil do casal e a situação ginecológica e reprodutiva da parceira.

  • Quando a qualidade dos espermatozoides é ruim na ejaculação, é melhor realizar uma captura por punção (PESA).

Mito. Os espermatozoides que têm baixa qualidade na ejaculação também o terão se capturados cirurgicamente. Como regra, os espermatozoides ejaculados terão maiores chances de apresentar melhores condições, principalmente pelo fato de terem passado por todas as etapas de amadurecimento (que não ocorre nos espermatozoides capturados cirurgicamente).  Contudo algumas raras e particulares situações tornam o ambiente dos deferentes mais sujeitos à toxicidade espermática e à piora das condições do material ejaculado. O principal exemplo dessa condição é o paciente cadeirante, pela ausência de ejaculações e por questões posturais. Em tais situações, pode ser necessária a captura de espermatozoides para evitar essas regiões de maior toxicidade, que deverá sempre ser realizada diretamente do interior dos testículos (pela cirurgia ou microcirurgia), e não por punção com agulha.

  • Podem-se realizar quantas punções para captura de espermatozoides (PESA) forem necessárias.

Discutível. A punção de epidídimo (PESA) é um procedimento extremamente simples e pode ser realizado com segurança. Porém realizar múltiplas punções pode trazer alguns riscos. Existem estudos mostrando que a repetição das punções pode levar a surgimento de tecido cicatricial e fibrose, fazendo com que tentativas futuras de punção sejam fracassadas. Isso pode constituir um problema, pois as punções são geralmente realizadas no mesmo momento da coleta de óvulos. Se não for possível a captura de espermatozoides, corre-se o risco de perda do tratamento, ou de necessidade de congelamento de óvulos, o que aumenta o custo e reduz as taxas de sucesso. Quando se prevê necessidade de maiores quantidades de espermatozoides (casos em que a parceira seja má respondedora e precise de diversas coletas de óvulos, por exemplo), deve-se optar por uma captura microcirúrgica de espermatozoides, na qual se conseguem quantidades seminais muito maiores, possibilitando congelamento suficiente para diversas tentativas, sem necessidade de se repetir procedimentos masculinos.

  • Avaliação médica masculina em infertilidade não é necessária, pois, para se realizar uma FIV-ICSI, basta apenas um espermatozoide.

Mito. Essa afirmação foi muito utilizada no início da década de 1990, quando as técnicas de reprodução assistida que utilizavam espermatozoides únicos foram criadas. Esse conceito, hoje, é completamente obsoleto em face do grande número de insucessos nos casos de ICSI, quando há problemas masculinos envolvidos, em especial, naqueles em que existem quantidades muito pequenas de espermatozoides. De fato, pode-se mesmo realizar tratamentos com apenas um espermatozoide. No entanto o objetivo não é a simples realização do tratamento, e sim a obtenção da gravidez saudável. O que quer que leve um homem a produzir quantidades muito baixas de espermatozoides interfere também na qualidade dos mesmos. Não faz sentido realizar tratamentos repetidos sem que haja otimização do quadro masculino diagnosticado. Muitas vezes, não se resolve completamente a questão masculina, mas se consegue levar o homem à sua melhor condição reprodutiva, maximizando as chances de sucesso e evitando o desgaste devastador que ocorre nas tentativas frustradas. Da mesma forma que a mulher é submetida à extensa investigação antes de se optar por algum dos tratamentos reprodutivos disponíveis, o mesmo deve ser idealmente aplicado ao homem. Quando há falha de tratamento de FIV sem que tenha havido avaliação masculina especializada, a mesma deve ser prioritária, antes de qualquer passo adicional.

  • Todos os homens que possuem varicocele precisam ser operados.

Mito. A conduta urológica clássica garante o tratamento de varicocele como ferramenta de incremento ao potencial fértil. São candidatos indiscutíveis para correção cirúrgica de varicocele os homens que apresentem varizes escrotais visíveis ou palpáveis, com quadro já estabelecido de infertilidade ou apresentando alteração na análise seminal ou no volume dos testículos. Dessa forma, precisam ser operados os portadores de varicocele que necessitem melhora seminal para aumento das chances de gravidez. Por sua vez, existem novas correntes que propõem microcirurgia de varicocele como estratégia preventiva à saúde testicular, evitando disfunções testiculares e andropausa precoce. Esta linha de pensamento é bastante promissora, uma vez que leva em conta a saúde masculina em sua totalidade. Deve, no entanto, ser aplicada em casos individualizados, não figurando ainda como indicação universal para correção da varicocele.

  • Operar a varicocele aumenta as chances de um tratamento em reprodução assistida funcionar.

Verdade. A indicação clássica de correção cirúrgica de varicocele visa ao aumento das chances de concepção natural. Quando se identificavam condições médicas no casal que necessariamente levariam à realização de reprodução assistida, tomava-se como rotina não valorizar a presença da varicocele. No entanto estudos muito recentes demonstram, com clareza, que o benefício trazido pela correção da varicocele se aplica, também, aos casais que realizarão tratamentos com a FIV. Isso faz com que a correção de varicocele seja incluída, também, como ferramenta de aumento de chances de sucesso da FIV, em especial, nos casos de apresentarem repetidas falhas de tratamento prévios. Melhorar a condição dos espermatozoides impacta positivamente em qualquer modalidade de tratamento. Não é correto insistir em tratamentos artificiais desgastantes sem que se tenha melhorado tudo aquilo que efetivamente pode ser melhorado. Correção de varicocele é, sem dúvida, o melhor exemplo desta situação: trata-se de uma causa de subfertilidade e de falha de tratamentos assistidos absolutamente passíveis de solução.

Dr. Guilherme Leme de Souza